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sábado, 24 de dezembro de 2011

Uma Véspera de Natal com alguma Esperança depois de desespero – 24 de Dezembro de 2011


A 21 o Jorge foi fazer análises no hospital local. “Por acaso”, como o médico não tinha tempo para falar connosco, soube os resultados “por outras vias”. Plaquetas a 103! Finalmente quando o médico pode dizer algo foi por interposta pessoa, a secretária de unidade a dizer que “as análises estavam muito bem”.
Eu já partilhara a angústia com a Susana que me aconselhou a preparar o Jorge de modo a não colocar a cabeça na areia.
No MarrowForuns de novo me avisaram que a dose de ciclosporina do Jorge está a ser para uma pessoa de 45 Kg. Ele tem 85!!!
Claro que quando a secretária de unidade disse isso eu disse que queria falar com o médico. Expliquei então que já falara há dias com o Dr. Mariz que mandara aumentar a dose de ciclosporina, etc, etc. Referi o meu receio que, com base na experiência anterior e no que leio e leio daqui a 1 mês (o médico não quer que ele faça análises antes) ele tem 60 plaquetas. Resposta “Isso não vai colocar a vida dele em risco.” O que vale foi que o telemóvel ficou sem bateria ou não sei, não.
Avante, já que dali não vinha mais. O recado pela secretária foi que não tinha tempo para falar connosco e que não concorda que o Jorge faça análises antes de 1 mês.
Passei uma noite em claro enviando emails e telefonei para a Itália. Foi-me dito para ligar às 10 da manhã.
Assim fiz, falei com o médico que também advoga 5 mg/kg/dia de ciclosporina, o que dá o dobro da dose que o Jorge faz. Aí é o desespero porque pela 2ª vez ele vai recair por má gestão medicamentosa!!!
Mas o Jorge a manter-se fiel até à morte com o médico do Porto.
Não parei!
Liguei para o IPO para Lisboa e pedi para falar com o chefe de equipa. Foi-me explicado (com bons modos) que, o que eu queria saber, se a dose que o Jorge está a fazer é a correcta, ninguém me vai dizer pelo telefone ou email sem conhecer o doente e o seu percurso. Fiquei a saber que nesta instituição os doentes são distribuídos por área de perícia dos médicos mas não consegui ligação com a médica que se dedica mais à anemia aplástica. Porém foi-me dito com todas as letras o que eu já tentara saber antes: um doente, desde que tolere , faz os ATG’s necessários.
Também fui orientada para a forma de entrar no IPO em Lisboa.
Ainda telefonei para o Aplastic Anemia & MDS International Foundation e foi reiterado que a dose de medicação do Jorge está a ser baixa.
Têm sido dias de desespero porque o Jorge não quer ouvir outra opinião e “não quer saber da doença”. Já diz o ditado popular, à primeira todos caem, à 2ª cai quem quer, à 3ª...
Ontem desmembrei.
Chega! Ele é gente, certo. Mas eu também sou.
Detesto a ideia de ir para Lisboa mas há que ouvir outra opinião. Uma pessoa não pode jogar com a vida numa doença tão séria por casmurrice.
E tive de ser m-u-i-t-o incisiva, mostrando os artigos da Doutora Judith Marsch e do Doutor Andrea Bocigalupo. As opiniões das Associações e dos Fóruns de quem lida com estas doenças.
Depois de chorar e gritar acho que ele compreendeu. Pelo menos admitiu que acha que algo não bate certo mas confia no médico. “E se ele tiver razão?” pergunta-me. “Fazemos-lhe uma procissão com ele em cima do andor” respondi-lhe.
Com tudo isto tive uma descarga que me provocou uma hemorragia.
Não consegui fazer nada para o Natal ontem.
Ainda embrulhei umas ofertas mas mais nada.
A minha mãe fez o pudim de coco e eu deitei-me completamente esgotada. É uma sensação de luta inglória. Viver nos Açores é terrível porque precisamos do aval dos todos poderosos (pelo menos alguns médicos se acham assim). Se eu fosse rica metia licença sem vencimento. Mas não sou nem ele é nem ninguém aqui é. Dependo do meu vencimento e não posso virar as costas. Precisamos da segurança social para avançar. Ir ouvir uma opinião a Lisboa é uma coisa, ficar meses em tratamento sem suporte da segurança social é outro.
Ausentar do serviço é outro peso mas ninguém trata uma anemia aplástica nos Açores. Não depende de mim e aí ponto final.
Falei com a Almerinda, com a Patrícia e com a Susana. Durante dias não me apeteceu falar com ninguém. Ontem já era capaz e quanto mais falava mais me consciencializava que estamos a trilhar um caminho muito perigoso por não questionar, por confiar cegamente, por não ouvir uma segunda opinião.
Ao sentir tanto desespero, desta vez não escondi nada do Jorge – não posso esconder mais ou isto acaba desastrosamente para a saúde dele e mesmo para a minha – ele admitiu que solicitará o envio para uma segunda opinião. Tive muito o apoio da minha mãe que consegue ser muito racional quando é necessário e incentivar a não desistir de o Jorge pedir essa segunda opinião.
Dormi como pomba até às 2 da manhã e aí acordei sem sono mas com alguma tranquilidade.
Levantei-me e preparei tudo para o Natal. Pelas 8 da manhã todos os doces estavam feitos. Saíram belissimamente. Todos! Lavei louça, esfreguei, bati, misturei, cozi, decorei, etc. etc.
Vai ter Natal sim, com as pessoas que aqui estão que são importantes.
Sem dúvida que chega uma altura que um doente tem que saber o que é a sua doença o que se passa consigo, etc.
Agora vou tomar um bom banho e descansar para então fazer os mexidos com o Diogo que os gosta de fazer comigo.
Até esta noite, cheia de angústia pensei que não podia ter um Feliz Natal. Posso e vou fazer por isso. Porque na doença também há felicidade. Como eu disse ao Jorge o caminho agora é “com verdade e ambos a olharem para o mesmo objectivo”.
Feliz Natal!

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